domingo, 25 de junho de 2017

VÍDEO ÁRBITRO, O ESPETÁCULO E A CULTURA DESPORTIVA

Um post devidamente cuidado e fundamentado sobre estes temas (tão, mas tão relacionados!) seria absolutamente gigantesco. Vou tentar apenas partilhar algumas das minhas ideias, sem sequer ousar procurar ser consensual.

Orgulho-me de pertencer a uma modalidade que privilegia o espetáculo em todas as alterações às regras que introduz, e que aceita que os árbitros são parte integrante do espetáculo, nem mais nem menos que qualquer outro interveniente. Orgulho-me de pertencer a uma modalidade em que os árbitros são quase sempre respeitados pelos atletas e treinadores, resultado de uma cultura desportiva evoluída. E é isso que me incomoda profundamente, o ver que, em outras modalidades como o futebol, se continua a encarar o árbitro como o cancro da modalidade, como o grande mal que é preciso resolver, como pessoas sem caráter que entram em campo sem dignidade. 
Compreendo as pessoas que dizem que o vídeo árbitro vem acrescentar justiça ao jogo. Sim, se estiverem definidos critérios de intervenção e ajuizamento (algo que ainda ninguém percebe) e se forem claras as situações em que este sistema funcionar e atuar (ainda são tudo menos isso). Nem sequer vou discutir as situações que até agora já se viram. Interessa-me mais o princípio da introdução das novas tecnologias.
Encarar o árbitro como o único fator de injustiça no resultado de um jogo é aberrante e ofensivo. É desculpabilizar os jogadores e treinadores ou, no mínimo, de atenuar as suas responsabilidades. Confesso que me faz muita confusão ouvir tantas vezes o cinismo do "vamos ajudar os árbitros a decidir" e poucas vezes "precisamos de trabalhar melhor", ouvir tantas vezes o "a culpa é do árbitro por não ter marcado penalty" e poucas vezes "a culpa é dos meus jogadores que falharam meia dúzia de oportunidades de baliza aberta". 
Além disso, quantas vezes já vimos casos em que decisões do vídeo árbitro são completamente dúbias, em que nem repetições atrás de repetições ajudam a esclarecer, e no fim acabamos por continuar a ter decisões baseadas em critérios subjetivos? Assim, o próprio princípio do vídeo árbitro FALHA.

E que efeitos tem isto no espetáculo? Bem, parece-me incontornável que a procura da justiça arruina o espetáculo. Aqueles minutos de espera por decisões, certas ou erradas, fazem desvanecer a emoção, fazem o espetáculo e a espontaneidade evaporar. E isto transporta-me automaticamente para a nossa cultura desportiva.

Que preço estamos dispostos a pagar para "procurar justiça"? Estamos assim tão desesperados? A sério que estamos prontos para abdicar da espetacularidade do Desporto em nome de uma suposta justiça que nem sempre vem?
Isto é a cultura desportiva que é incutida no nosso povo, por dirigentes nem sempre bem formados e por uma comunicação social que não cumpre o seu papel. O destaque dado aos erros dos árbitros em programas televisivos de qualidade mais que duvidosa, em vez de dar o devido destaque aos aspetos mais belos do jogo e das verdadeiras estrelas, que são os jogadores, envenenam a mente das pessoas e fazem-nos crer que os árbitros são os culpados de todas as derrotas e a causa de todas as incompetências.

Espero que o Andebol não caia na tentação crescente de introduzir tecnologias indiscriminadamente na condução de um jogo. Sim, há coisas que podem ser úteis. Mas utilizemos só aquelas que nos possam ajudar, em vez de "desajudar".
Se tal vier a acontecer, bem, aprendamos a lidar com a evolução. Enquanto não acontecer, só posso desejar que continuemos a encarar o Desporto com o que de melhor ele tem.

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